Este pequeno excerto retirado de um livro de 1896 sobre a Real Casa Pia de Lisboa, relata-nos como eram distribuidas as refeições ao longo do dia na referida instituição em dois momentos distintos: antes e depois de uma grande reforma institucional ocorrida por volta de 1880.
Este excerto levou-me a questionar como, em menos de cem anos, esta distribuição e o modo como chamamos cada refeição tanto se alterou.
Eis que Ana Motta Veiga desfaz as minhas dúvidas, dizendo:
"Nem
sempre as três principais refeições do dia (pequeno-almoço, almoço e
jantar) tiveram o mesmo nome e o mesmo significado...sendo que os
"lanches" tão pouco existiam e apenas se conheciam as merendas...
A
primeira refeição da manhã (apesar de pequena) seria chamada de Almoço
ou o Almorço, com r: "Almoçar. Comer alguma cousa antes de jantar. (...)
O que se come pela manhãa. Por ser em pequena quantidade,
parece derivado do Arabico Al, & do Latim Morsus, que vale o mesmo,
que mordeduras, porque almoçar he dar quatro mordeduras, & comer
quatro bocados.";
Seguia-se o Jantar ou Iantar, com i, "Tomar sua refeição pellas horas do meyo dia", ao que actualmente chamamos de almoço;
Ao "lanche", ou aos lanches do dia, chamar-se-iam de merendas:
"Merenda. Comida entre dia. O que se come entre o jantar, & a cea.";
A ceia, ou o "Tomar a refeição da noite.", é ao que hoje chamamos de
jantar, e que pelo ditado popular se supõe que seria tomada cedo: "Quem
cea, & se vay deitar, mâ noite hâ de passar.";
É curioso que os
nomes das refeições se alteraram, ou seja, avançaram no horário, e
pergunto-me se não terá sido também um dos impactos do aparecimento da
luz eléctrica, fazendo "o dia" mais longo. Ao que chamamos hoje de ceia,
refeição após o jantar, era hábito que nem se colocava no tempo em que
as pessoas se deitavam "com as galinhas" e acordavam "com o cantar do
galo"..."