Felisberto Manuel Teles Jordão Robles
Monteiro, ator e empresário em atividade no século XX, tem o seu nome
indissoluvelmente ligado a uma das mais importantes companhias de teatro
portuguesas – a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro –, justamente a
que durante mais tempo marcou um estilo no teatro português.
Discípulo de Augusto Rosa, Robles Monteiro integrou a companhia
residente do Teatro Nacional D. Maria II, mas insatisfações crescentes
com o meio teatral estabelecido levaram-no, em 1921, a criar a sua
própria companhia com a sua mulher, Amélia Rey Colaço. Foi aqui que
revelou os seus dotes de empresário, sendo responsável pela gestão
administrativa da companhia, mas provando ter também uma competência de
ensaiador, o que lhe valeu elogios à sua capacidade de formar novos
atores e dirigir em cena nomes já estabelecidos da cena teatral.
Nascido
em São Vicente da Beira, Robles Monteiro iniciou a sua vida num
percurso totalmente distinto daquele que o iria notabilizar: frequentou o
seminário (algumas fontes indicam o Colégio de S. Fiel, perto de casa,
outras o seminário da Guarda) com o objetivo de seguir a vida clerical.
Segundo consta, foi durante uma récita escolar que o próprio bispo,
perante o talento do jovem, o aconselhou a enveredar pela arte teatral
(SANTOS 1989a: 4). Numa mudança de rumo, frequentou o Curso Superior de
Letras como voluntário, modalidade que lhe permitia assistir às aulas
sem, no entanto, ser submetido a avaliação e, como tal, isento do
pagamento de propinas. Este interesse pelas Letras levou-o ainda a
trabalhar como noticiarista e jornalista em Lisboa, mas apenas por um
breve período, uma vez que o teatro falou mais alto e, a 27 de dezembro
de 1913, estreou-se no espetáculo
A caixeirinha, no Teatro República.
Foi acolhido como discípulo por Augusto Rosa, com quem aprendeu não
só a arte dramática, mas também uma atitude perante a vida e os
costumes, sendo presença assídua na casa do mestre e participando nas
receções que este ali organizava, um privilégio partilhado por muito
poucos, mas incluindo Amélia Rey Colaço, também ela discípula de Rosa.
Poucos anos mais tarde, a 4 de dezembro de 1920, mas já após a morte do
mestre (1918), os dois discípulos acabariam por casar (um destino
bastante desejado por Augusto Rosa, segundo Amélia), e essa união
revelou ser uma das mais fortes do teatro português, tanto a nível
pessoal como profissional.
Durante a época de 1920-21, o casal integrou o Teatro Nacional D.
Maria II, que atravessava um período de algum desprestígio, devido não
só a limitações artísticas (praticando um naturalismo já relativamente
fora de moda) e à falta de meios económicos para produções de qualidade,
mas também à indisciplina entre os atores da companhia, movidos
sobretudo por egoísmos e guerras de vaidades. A apresentação de
Zilda,
de Alfredo Cortez, a 5 de março de 1921 (onde Robles desempenhou o
papel de Manuel de Castro, e Amélia o da protagonista) pareceu
despoletar conflitos internos que levaram à saída de ambos da companhia
do Nacional. Determinados a contrariar a aparente decadência do teatro
português, criaram a sua própria companhia.
A Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro estreou-se precisamente com
Zilda,
no Teatro Nacional de S. Carlos, a 18 de junho de 1921, ainda com
encenação de António Pinheiro, e o casal de atores a assegurar os mesmos
papéis que haviam desempenhado no Nacional. Na primeira fase da
companhia, Robles participou na interpretação de todos os espetáculos,
partilhando a direção artística do grupo com Amélia. Após uma primeira
época no S. Carlos, a companhia instalou-se no Politeama e,
posteriormente, no Ginásio e no Trindade, até 1930. Robles Monteiro
passou a assinar com maior frequência a encenação dos espetáculos,
muitas vezes em conjunto com a mulher, e desligou-se progressivamente da
interpretação.
As qualidades de Robles Monteiro como organizador e ensaiador
tinham-se manifestado já cedo – em 1919 havia dirigido a sua própria
companhia no Teatro do Ginásio – mas foi durante o longo percurso da
Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro que elas mais se revelaram. Assim,
enquanto Amélia brilhava na interpretação e na direção artística dos
espetáculos (era famoso o seu bom gosto na decoração dos cenários e no
cuidado que a eles dedicava, mesmo quando eram convidados artistas para a
criação dos cenários e figurinos), Robles afirmava a sua apetência pela
marcação dos espetáculos e distribuição dos papéis, os ensaios e a
formação dos atores. Esta última valência foi particularmente importante
para a consolidação de um elenco notável, entre atores novos e outros
consagrados, e que se manteve com uma qualidade muito apreciável. Foram
muitos os atores de renome que fizeram questão de passar pela companhia,
e muitos os atores novos (alguns sem passagem pelo Conservatório) que,
junto de Robles Monteiro, tiveram a sua formação e lançaram a sua
carreira teatral, como foi o caso de Raul de Carvalho, Álvaro Benamor,
Maria Lalande, Assis Pacheco e Eunice Muñoz, entre outros, incluindo,
naturalmente, Mariana Rey Monteiro, filha de Amélia e Robles. Foi visto
por muitos como uma figura quase paternal, a quem recorriam para
conselhos acerca da carreira e da vida em geral, sendo disso exemplo a
correspondência entre o casal e Carlos Avilez, Carmen Dolores, ou Helena
Félix.
Foi também responsável pela gestão administrativa da companhia,
tarefa particularmente difícil a partir de 1929, ano em que lhes foi
concedida a exploração do Teatro Nacional D. Maria II. As condições da
exploração eram desfavoráveis a qualquer companhia com alguma ambição a
nível artístico, pelo desequilíbrio entre as exigências estipuladas (a
nível de repertório) e as ajudas concedidas para o efeito. No entanto, e
apesar das inúmeras crises financeiras mais ou menos graves por que
passaram ao longo dos anos, a gestão de Robles Monteiro permitiu o
equilíbrio da companhia e a marca de algum prestígio que trouxeram ao
Teatro Nacional D. Maria II.
Durante os ensaios de
O processo de Jesus, Robles Monteiro
sentiu-se mal, acabando por morrer pouco depois em casa, a 28 de
novembro de 1958. Ficou para a história como o “homem, de fala lenta,
simples e metódico, de uma sensibilidade
exquise que nem todos captavam” (
Diário de Lisboa,
29-11-1958, p. 8), conhecido também pelo seu cavalheirismo e figura
elegante, tendo como “imagem de marca o distinto monóculo e o sotaque
beirão, que nunca abandonaria” (BARROS 2009: 129).