Doces e Cosinhados, de Isalita, Centro Tipográfico Colonial, 1925, pág. 258/259
Sarah Bernard (Bernhardt)
40 gr. de fécula de batata, 45 gr. de farinha de trigo, 90 gr. de açúcar, 4 ovos e 30 gr. de manteiga. Bate-se como para pão de ló. Deita-se num tabuleiro untado de manteiga e polvilhado de farinha. Depois de frio cortam-se uns quadrados de 5 centimetros. Se a massa está muito alta, cortam-se em duas ou três partes de altura, por forma a que depois de sobrepostos dois com o recheio, não fiquem com mais de 4 a 5 centrimetros.
Recheio: 120 gr. de manteiga, 3 ovos, açúcar muito fininho e baunilha. Deita-se a manteiga numa tijela e bate-se com os ovos, pondo um de cada vez. Depois de bem ligado, mistura-se o açúcar a gosto e a baunilha. Bate-se até desaparecer o açúcar. Recheiam-se com isto os quadrados. Barram-se com um pouco desta manteiga em volta e salpicam-se com amêndoa picada e torrada, menos em cima, que se enfeitam com fatias muito fininhas de amêndoa, cortada a todo o comprimento, que se espeta toda direitinha na parte de cima dos quadrados.
Curiosidade:
Uma das mais conhecidas actrizes de
teatro de sempre.
Nasceu em
Paris, França, a 22 ou 23 de Outubro de 1844;
morreu em Paris, a 26 de Março de 1923.
Filha natural de uma famosa cortesã
holandesa de origem judia, Judith van Hard e de um estudante de
direito francês, Edouard Bernard, que se tornará notário no porto do Havre, foi-lhe dado o nome de Henriette-Rosine
Bernard. Como a presença de uma criança interferia com a vida da mãe, foi enviada
para uma pensão para raparigas de Auteil e mais tarde deu entrada num convento
de Versalhes. Criança difícil e de
saúde frágil, converteu-se ao catolicismo, sendo baptizada e fazendo a primeira
comunhão em 1856, querendo mais tarde professar e tornar-se freira. Um dos
amantes da mãe, o duque de Morny, meio-irmão materno do imperador Napoleão III,
decidiu que a rapariga deveria ser actriz, e quando completou 16 anos
conseguiu que fosse admitida no Conservatório de Paris.
Não sendo
considerada uma estudante muito promissora, Sarah, que admirava alguns dos seus
professores, achou que os métodos de ensino da instituição eram antiquados e
muito tradicionalistas. Deixou o Conservatório em 1862, com 18 anos, sendo aceite,
devido ao empenho do duc de Morny, na Comédie Française, como
discípula. Nas três diferentes peças em que teve de entrar, a primeira das quais foi
a Iphigénie et Aulide de Racine, em 11 de Agosto de 1862, necessárias para
poder passar a actriz residente,
não foi notada pelos críticos. O seu contrato foi cancelado no ano seguinte,
devido a ter esbofeteado uma das principais actrizes, que tinha sido um pouco
rude com a sua irmã mais nova, Régine.
Passou então a fazer parte do elenco do Thêatre
du Gymnase-Dramatique. O período foi de reflexão, devido aos pequenos
papéis que lhe atribuíam em peças de pouco interesse, tendo pensado mesmo em
abandonar os palcos. É também um período onde os amantes se sucedem, entre os
quais o príncipe de Ligne, pai segundo parece do seu único filho, Maurice.
Em
1866, foi contratada pelo Teatro Ódeon, e com a competente companhia residente
do teatro e muito trabalho começou a sua ascensão. O seu primeiro sucesso foi no
papel de Anna Damby na peça Kean de Alexandre Dumas pai, mas a
sua interpretação de Cordélia no Rei Lear, de Shakespeare, já
tinha sido notada. Já conhecida como a actriz favorita dos estudantes
parisienses, a sua interpretação, em 1869, do trovador Zanetto na peça
em um acto e em verso de François Coppée Le Passant, o seu primeiro
papel em travesti, teve um imenso sucesso, que a levou a uma representação
privada para Napoleão III.
Durante a guerra
franco-prussiana de 1870-1871 organizou um pequeno hospital militar nas
instalações do teatro. Com o fim da guerra, a deposição de Napoleão III, e
a proclamação da República, a actriz, mal vista pelos republicanos, devido
às suas conhecidas relações e defesa de personagens do anterior regime,
conseguiu o principal papel feminino, o da Rainha Maria, na peça de Victor
Hugo Ruy Blas, que tinha acabado de chegar do exílio. A sua
actuação encantou as audiências, devido sobretudo ao lirismo da sua voz. Foi
a razão da célebre frase de Victor Hugo, que afirmou que a actriz tinha uma
«voz de oiro», caracterização que perdurou apesar dos críticos já
descreverem a voz de Sarah Bernhardt como sendo prateada, devido à sua
parecença com o tom de uma flauta.
Em 1872 deixou o Ódeon e regressou
à Comédie-Française, possivelmente devido à intervenção de Hugo.
Participou com sucesso na Zaire de Voltaire, mas normalmente os seus
papéis eram secundários, até ao momento em que interpretou o papel de Vénus
na Phèdre de Racine, substituindo a actriz principal, temporariamente
doente. As críticas foram entusiásticas, ainda por cima porque se pensava que
Sarah não tinha capacidade de interpretar papéis apaixonados. Mais tarde
interpretou a Doña Sol no Hernani de Victor Hugo, de uma maneira
que terá levado o autor às lágrimas.
Tendo começado a esculpir e a pintar,
exibiu as suas obras de escultura de 1876 a 1881 no Salon de Paris,
tendo-lhe sido atribuída uma menção honrosa no primeiro ano. Em 1880 exibiu
também uma pintura.
Em 1879, Londres rendeu-se à interpretação de
Sarah Bernhardt no segundo acto da Phédre, produzido no Gaiety, durante
a exibição da Comédie em Inglaterra. Uma carreira internacional estava
à sua disposição, a partir desse momento. Por isso, o regresso às instalações da companhia
trouxeram de novo os já famosos ataques de má disposição. O corte com a Comédie
deu-se rapidamente, e em 1880 Sarah Bernhardt abandonou a companhia oficial
francesa, indo representar em Londres e depois na Dinamarca.
Tendo criado a
sua própria companhia, com a ajuda do empresário londrino Jarrett, partiu para
os Estados Unidos, acompanhada de uma secretária, um mordomo, dois cozinheiros,
duas criadas de quarto e um empregado. Durante dois meses percorrerão cinquenta
cidades americanas. Nova Iorque é a primeira cidade americana a vê-la, em 8 de
Novembro de 1880. Regressará ao Novo Mundo mais oito vezes. De regresso à
Europa actua em todo o lado, tirando a Alemanha. Em Odessa, na terra dos czares,
ia sendo cachinada por anti-semitas russos. Mas o czar presta-lhe homenagem
pública.
Na década de 80 aparece na sua vida o dramaturgo Victorien Sardou,
que escreve para a actriz Fédora (1882), Théodora (1884), La
Tosca (1887) e Cléopâtre (1890), dirigindo-a nas suas próprias
peças e levando-a a actuar de uma maneira extrovertida, em cenários exóticos
e com guarda-roupas riquíssimos, no Teatro de La Porte Saint-Martin, de
que a actriz se tinha tornado proprietária. Entretanto casara, em 1882 em
Londres, com Jacques Damala, um jovem grego amante da sua irmã mais velha,
actor sem talento e drogado notário. O casamento não dura devido à morte do
marido.
De 1891a 1893 fez uma digressão mundial que incluiu a Austrália e a
América do Sul, para além da América do Norte e as principais capitais
europeias. O seus papéis mais populares, para além da Phèdre, são o
de Marguérite Gautier na Dama das Camélias de Alexandre Dumas
filho e no papel principal na Adrienne Lecouvreur de Eugène Scribe. No
fim da digressão, de regresso a Paris, compra o Teatro La Renaissance,
que inaugura com a peça de Jules Lemaitre, Les Rois. Em 1896 fez um
sucesso com uma adaptação do Lorenzaccio de Alfred de Musset, sendo
homenageada oficialmente em Paris, com a realização de uma grande festa e
envio de felicitações dos quatro cantos do mundo.
Em
1899 vende o La Renaissance e muda-se para o Théâtre des Nations, que
inaugura com La Tosca. Em 1900 inaugura o Thêatre Sarah Bernhardt
com a peça de Edmond de Rostand L'Aiglon. Nesse palco representa o bom e
o muito mau. As peças medíocres são apresentadas por necessidade financeira
ou para retribuição a amigos.
Uma ferida mal curada no joelho direito,
provocada por uma queda na última cena da Tosca, durante uma digressão
pela América do Sul em 1905, que apanha gangrena obrigou à amputação da
perna em 1915. O facto não a impediu de visitar os soldados na frente ocidental
durante a Primeira Guerra Mundial, e de, no ano seguinte, voltar aos Estados
Unidos para uma extenuante digressão de 18 meses. Em Novembro de 1918 regressou
a França, aproveitando o fim da guerra para realizar uma digressão pela
Europa.
Em 1920 publicou um romance, Petite Idole, obra com algum interesse,
já que a heroína é uma idealização da carreira e das ambições da actriz.
Durante
os ensaios finais da peça de Sacha Guitry Un sujet de Roman, desmaiou,
recuperando de forma a participar no filme do mesmo autor La Voyante,
produzido por Hollywood, e filmado na sua própria casa em Paris, mas durante o qual foi
acometida de várias síncopes. Acabou por morrer em Março de 1923.
Sarah Bernhardt, actriz, dramaturga e escultora, visitou quatro
vezes os nossos teatros para representar algumas das peças de
maior êxito da sua carreira artística. A imprensa portuguesa
deu, então, a conhecer a actriz que se permitia todas as
excentricidades: era ousada nas atitudes, foi sustentada por
amantes, indignou e fascinou dóceis respeitadores das leis. Não
esqueceu, também, a ‘face’ da Sarah que militou contra a
pena de morte, foi enfermeira no cerco de Paris, pugnou pela
inocência do capitão Dreyfus e defendeu Zola. Depois disso, em
1916, e com os seus presumíveis 72 anos, doente e sem uma
perna, foi à frente de batalha recitar Le
Vol de la Marseillaise para levantar o moral das tropas.
Quando lhe foram pedir para assinar um documento a favor
dos direitos das mulheres, lembrou que tinha feito tudo quanto
lhe tinha apetecido e não assinou porque “preferia os actos
às declarações”.